(Português) Conheça cinco advogadas que estão transformando o mundo para os animais

ORIGINAL LANGUAGES, 10 Apr 2017

Laura Dourado – Agência de Notícias de Direitos Animais

Foto: Jo-Anne McArthur / The Unbound Project

29 de março de 2017 – No final de 2016, a cidade de Montreal, no Canadá, foi centro de discussões sobre direitos animais. Essa bela cidade é mundialmente conhecida por sua história, cultura e jazz, recebeu a atenção da mídia ao banir pit bulls através da Legislação Específica Para Determinadas Raças de Cães (BSL, Breed Specific Legislation). As advogadas Alanna Devine e Sophie Gaillard trabalham na Montreal SPCA, a agência de proteção animal mais antiga do Canadá e elas participaram da linha de frente nessa luta contra a legislação.

A briga contra a BSL em Quebec é apenas um dos casos mais recentes onde advogados e advogadas canadenses usaram sua expertise para tentar fazer a diferença para os animais, e agora, junto com Devine e Gaillard, outras três advogadas se destacam por seu comprometimento com os animais do Canadá: Camille Labchuk, Anna Pippus e Lesli Bisgould.

Essas cinco mulheres possuem grande visibilidade e influência no campo da lei animal canadense nos últimos anos. Bisgould, que abriu o primeira consultório de direitos animais no Canadá, deixou de exercer a legislação animal para ensiná-la.

Pippus e Labchuk passaram boa parte da vida construindo o Animal Justice, a única organização nacional de direito animal do país (Labchuck atualmente trabalha como diretora executiva da organização) e, assim, contribuíram com seus conhecimentos com uma enorme gama de casos envolvendo animais. As repórteres Jo-Anne McArthur e Keri Cronin do The Unbound Project passaram cinco dias com essas cinco advogadas para falar sobre a área dos direitos animais, a evolução da proteção e direito animal nos últimos anos e conselhos para quem quer atuar na área.

Apesar dessas cinco advogadas terem antecedentes e áreas de expertise diferentes, há muito em comum entre elas. “Estamos todas focadas em conseguir a libertação animal por meio da lei”. Labchuk concorda, “para mim, o Direito e ser uma advogada é apenas uma ferramenta para conseguir a libertação animal. Não é um fim ou um meio em si”.

Bisgould lembra como as coisas eram antes, como o modo dominante de pensar em relação aos animais e a lei eram “uma ferramenta que os advogados usaram para capacitar advogados para lutar pelas coisas”. Agora, no entanto, “os próprios advogados querem ser defensores e isso é mesmo uma mudança”, ressalta.

Devine, Gaillard, Labchuk, Pippus e Bisgould concordam que as coisas estão mudando rapidamente no contexto da lei animal canadense e que recentemente tem havido um grande interesse em usar o sistema legal para tornar o mundo um lugar melhor para os animais. Outra mudança importante que essas mulheres percebem é que a aceitação para que os advogados se “envolvam” com os seus casos aumentou.

Gaillard lembra de ser aconselhada na faculdade a “não ser muito apaixonada por qualquer caso que você esteja trabalhando, manter-se fria e objetiva, sem investimentos emocionais, pois esse não seria um bom trabalho”. “Essa ideia de que você só pode ser um bom advogado se você não tem laços emocionais – eu sempre achei uma besteira!”, completou.

Enquanto essas cinco mulheres se esforçam para usar a lei como uma forma de defesa dos animais, elas também reconhecem que as vias legais podem ser algumas vezes “imperfeitas”. Como Gaillard aponta: “quando nós escolhemos a lei como nossa ferramenta, somos forçadas a algumas vezes nos contentar com menos do que esperávamos”. Ela lembra de um amigo e mentor que a alertou sobre não ir para a faculdade de Direito se ela realmente se importava em fazer alguma diferença para os animais: “você não pode ser um advogado dos animais e ser verdadeiro em relação às suas crenças filosóficas da prática”.

Foto: Jo-Anne McArthur / The Unbound Project

Gaillard não hesitou e discordou do ponto. Ela entende que as vezes as estratégias legais levam muito tempo para se desdobrar e as vezes é necessário mover-se gradualmente, o que envolve compromisso: “pode haver pequenas coisas que você pode fazer e que estão de acordo com seus princípios, mas acho que muito do nosso trabalho requer um pouco de afastamento e abordagem do que pode parecer uma questão pequena no grande esquema das coisas, mas que em última análise ajudam a desenvolver jurisprudência de modo a promover os interesses dos animais”.

Nessa área, tudo pode acontecer muito vagarosamente e o que parece avançar normalmente é frustrado por vários obstáculos. Mesmo que isso possa parecer assustador e desencorajador, é importante celebrar tanto as grandes quanto as pequenas vitórias durante o caminho, como Devine mostra: “tudo que nós fazemos que reduz o sofrimento de algum jeito deve ser considerado uma vitória, então se você se concentrar em um animal ou se propuser a mudar a maneira como eles vivem; ambos são uma vitória”.

Para Pippus também é muito importante que as pessoas “vejam que o movimento está ganhando visibilidade e que nossas vitórias estão mudando as coisas”, pois essa é uma parte importante de mudar o status quo.

Essas cinco advogadas são veganas e querem que as discussões sobre o tratamento dos animais no Canadá incluam todos os animais, pois é frustrante ver pessoas que se importam profundamente com animais domésticos, como cães e gatos, mas ficam cegas quando se trata do sofrimento de outros animais, o que é bem visível com o crescimento dos “ovos livres de gaiolas”.

Contudo, Pippus aponta que “se alguém está dizendo que ‘se importa sobre como os animais são tratados e portanto devem ficar foram de gaiolas’ nós precisamos pegar essa compaixão e dizer ‘ok, se é assim que você se sente, a única solução são os direitos dos animais e o veganismo’”, e Devine complementa: “se você pode fazer as pessoas reconhecerem que o primeiro passo em relação aos animais criados em] fazendas é respeitá-los e assim fazê-las se preocuparem com o tratamento deles, eventualmente elas vão entender que não é humano fazer qualquer das coisas que fazemos para criar animais”.

Mesmo quando as coisas ficam difíceis e as vitórias aparentam não significar muito, Devine, Gaillard, Labchuk, Pippus e Bisgould continuam motivadas a lutar pelos animais. Gaillard salienta que elas não estão nisso pelas vitórias, mas sim porque “nós não temos escolha. Nós iremos morrer tentando, não podemos apenas sentar e assistir a crueldade animal acontecer sem tentar fazer alguma coisa em relação a isso”.

Para Devine, o mais importante que os advogados podem fazer para mudar o status quo é normalizar as conversas sobre os animais na nossa sociedade. “Algo muito importante que deveríamos fazer é encorajar o estudo das leis animais nas faculdades de Direito, conversando com os futuros advogados, juízes e políticos e assegurando que suas crenças pessoais estejam alinhadas com o entendimento da senciência e dos direitos animais, isso é muito importante”. Para Devine, isso mudará a preocupação pelos animais no domínio jurídico, que sairá das margens e se tornará mais difundida.

A área do Direito Animal está crescendo exponencialmente no Canadá, como Bisgould coloca, “o Direito Animal passou de uma ideia para um fato”. Labchuk conta que quando começou havia apenas um punhado de aulas sobre Direito Animal e muitas pessoas desprezavam sua ideia de ser uma defensora dos animais. Agora, ela mostra que o número de publicações acadêmicas relacionadas ao assunto no Canadá, assim como o número de casos envolvendo animais que regularmente aparecem em destaque nas notícias só cresce – “esses problemas estão na mídia todos os dias”, aponta.

Esse aumento de consciência pelos direitos animais está começando a encontrar seu caminho também nas faculdades de Direito do Canadá. “Isso é o que me anima em relação ao futuro, em 20 anos todos que cursaram uma faculdade de Direito terão tido contato com os direitos animais na sala de aula”, diz Labchuk.

Além disso, as cinco advogadas veem a orientação como uma parte importante de suas vidas profissionais e regularmente conversam com estudantes que têm interesse em seguir carreira na área e, a partir disso, todas também notam que parece haver um aumento notável no número de jovens – em particular mulheres jovens – que querem fazer parte do Direito Animal canadense. Bisgould aconselha esses estudantes a terem uma mente aberta e trabalhar para ter bastante experiência.

Enquanto o Direito Animal realmente explodiu no Canadá nos últimos anos, o número de trabalhos disponíveis na área não acompanhou esse crescimento. “As vagas em Direito Animal são poucos e distantes”, Labchuk lamenta, mas isso não significa que as pessoas que querem seguir carreira na área devam se sentir desencorajadas. “Se você trabalha em tempo integral ou não você pode fazer uma enorme contribuição para o campo, trabalhando em uma empresa maior, trabalhando em outra organização e fazendo Direito Animal, sendo pro bono ou voluntariado, há muitas maneiras de contribuir”, acrescenta.

Devine complementa: “não há um caminho a ser seguido, não tenha medo de criar o seu. Há muitas pessoas fazendo coisas interessantes pelos direitos animais que não são em tempo integral. Mesmo que você não consiga um cargo no final que seja 100% direito animal, é importante lembrar que ainda há muito a ser feito em outras profissões, principalmente no governo ou na polícia, precisamos de políticos, juízes e advogados que tenham a mente aberta em termos de violência contra animais e ter advogados no governo que considerem os direitos animais faria uma grande diferença”.

Embora o Canadá esteja atrás dos Estados Unidos em termos de desenvolvimento do Direito Animal, houve um consenso geral de que isso poderia, de fato, ser uma coisa boa, pois aqueles que trabalham com o tema no Canadá agora poderiam ter um pouco mais de liberdade para pensar, estudar e criar as coisas de forma que elas façam sentido para clima social, cultural e político do país.

Devine ressalta: “nossas leis são diferentes e eu acho que as perspectivas das pessoas evoluíram e talvez não seja ruim que estejamos apenas começando a pensar em maneiras criativas de desafiar o status quo no Canadá”. Labchuk concorda, observando que “estamos no início do movimento e há muito espaço para moldá-lo na direção certa neste momento”.

Bisgould, que é considerada por muitos como uma das figuras fundamentais do Direito Animal no Canadá (e certamente alguém que Labchuk, Pippus, Devine e Gaillard apontam como tendo uma enorme influência no seu desenvolvimento na área), está disposta até a buscar outro termo para substituir o “Direito Animal”, porque ela vê que isso está aquém de ser capaz de “transmitir suficientemente a ideia de que o objetivo da disciplina é ensinar o status de propriedade dos animais e estabelecer direitos legais reais para eles. A lei sobre animais é um termo tão amplo que poderia se aplicar a todos os tipos de conflitos envolvendo animais, onde seus interesses não são necessariamente importantes”, afirma.

Pippus concorda que há uma distinção entre meramente praticar o Direito que envolve animais e expandir a lei para incluir “os interesses dos animais no tribunal de uma série de maneiras”. Como ela enfatiza, “os animais devem estar em todas as áreas do Direito porque os animais afetam todas as áreas da nossa vida”.

Foto: Jo-Anne McArthur / The Unbound Project

Talvez um dos fatores mais promissores sobre o futuro do Direito Animal no Canadá é que há muita cooperação e coligações entre várias organizações dedicadas à proteção animal se formando. “Há muita cooperação entre bastidores. Nós estamos conectados o suficiente para que, embora possamos tomar diferentes abordagens para diferentes questões, ainda vamos nos comunicar porque todos ainda têm o objetivo de reduzir o sofrimento”, diz Devine.

Labchuk, por exemplo, fala com orgulho sobre a forma como vários grupos diferentes se uniram em apoio ao projeto de lei C-246, apresentado pelo deputado liberal Nathaniel Erskine-Smith, que visava atualizar e modernizar a legislação de proteção animal do Canadá e, apesar de derrotado em última instância, a forma como os grupos que normalmente não trabalham juntos fizeram isso neste caso foi muito encorajadora, assim como as conversas que aconteceram em todo o país sobre o projeto de lei.

Devine, Gaillard, Bisgould, Labchuk e Pippus concordam que tiveram a sorte de não experimentar discriminação explícita por causa de seu gênero em suas vidas profissionais. Labchuk acredita que isso se deu porque “no Canadá a cena do direito animal é majoritariamente feminina, principalmente em posições de liderança. As líderes da maioria das organizações animais no Canadá são mulheres, enquanto que nos Estados Unidos são, em sua maioria, homens. Eu não tenho explicações porque isso acontece, mas, consequentemente, nunca pensei sobre gênero como um fator limitante para avançar na área porque eu nunca vi isso ser um problema aqui e minhas admirações profissionais são todas mulheres”.

Pippus concorda, observando que quando você é vegana e envolvida com direitos animais, você já pensa um pouco fora da caixa e não internaliza as ideias de outras pessoas.

Uma confusão que acontece, no entanto, é o conceito de que elas estariam mais preocupadas com os animais por serem mulheres, e Gaillard aponta que em sua profissão “ser compassiva e preocupada com os animais é muitas vezes equiparado a ser excessivamente emocional e sensível e isso é uma forma de sexismo”.

Para Pippus, a ideia de ser emocional é algo inferior – “você está me dispensando porque eu sou emocional? Sou emocional mesmo! Estou com raiva e irritada com os maus-tratos contra os animais porque quem é que não estaria?”, questiona.

Esses tipos de conversas representam novos horizontes na maneira como questões de bem-estar animal são discutidas e consideradas nos círculos legais. Como Pippus ressalta, “a atenção cultural às questões animais está decolando como nunca antes”. No Canadá, isso acontece, em grande parte ,graças aos esforços inovadores de pessoas como Devine, Gaillard, Bisgould, Labchuk e Pippus, que não irão desistir da luta coletiva pela libertação animal.

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